A Ciência Ameaçada
Rogério Gribel
O Brasil é considerado o país com a maior diversidade de espécies de plantas
no mundo. As plantas sustentam as outras formas de vida na Terra, promovendo
serviços ambientais para a humanidade, como regulação do clima, conservação dos
solos, manutenção da fauna e melhoria na qualidade do ar e das águas. Porém,
muitos dos ecossistemas brasileiros estão ameaçados. Os jardins botânicos do
mundo têm como meta promover o conhecimento científico da flora, o entendimento
público sobre o valor das plantas e a importância das questões ambientais,
contribuindo para a formação de cidadãos conscientes em um planeta em rápida
transformação. Nesse esforço se insere o Jardim Botânico do Rio de Janeiro –
instituição bicentenária de reconhecimento internacional.
Considerando o
cenário de mudanças climáticas e pressão crescente sobre os biomas do país, os
desafios no futuro próximo serão imensos.
Para o cumprimento de sua missão, o
Jardim Botânico necessita cultivar, conservar, pesquisar e apresentar ao público
exemplares das espécies da flora nacional, especialmente aquelas ameaçadas de
extinção, além de outras milhares de espécies raras, de importância
etnobotânica, ornamental, medicinal, etc. No entanto, enquanto o número de
espécies ameaçadas aumenta devido à rápida ocupação do território nacional, as
áreas disponíveis no Jardim para seu cultivo, pesquisa e conservação vêm se
restringindo em função de ocupações irregulares em sua área tombada.
As áreas
do antigo Horto, e que estão dentro do perímetro tombado da instituição, eram
recobertas, desde o início do século XX, por experimentos científicos com
espécies arbóreas. Isto é comprovado de forma inquestionável, inclusive por
meio de foto aérea, no livro “Contribuição à dendrometria das essências
florestais”, de Guilherme de Almeida, publicado em 1949, que descreve e mapeia
os talhões florestais implantados na época. Esses experimentos pioneiros foram
paulatinamente suprimidos, principalmente a partir da década de 60, para
construção de moradias e pontos de comércio, além da instalação de um prédio do
Serpro e de uma subestação da Light.
Como resultado, o Jardim encontra-se
atualmente engessado quanto às possibilidades de expansão de suas coleções
científicas vivas e das áreas para visitação pública, que já chega a mais de
700 mil visitantes por ano. Os pesquisadores não mais trazem, de suas inúmeras
expedições, sementes e mudas de árvores para plantio, pois não há onde
cultivá-las.
A reintegração ao Jardim das áreas tombadas do Horto e a
restauração da sua integridade territorial e paisagística são essenciais para
que a instituição possa cumprir suas importantes missões nas áreas científica, conservacionista
e educativa. Isso permitirá às gerações futuras conhecer e valorizar ao menos
uma parcela da magnífica biodiversidade de que a natureza nos proveu nesta
parte do planeta chamada Brasil.
Artigo reproduzido do Jornal O Globo, edição de quarta-feira, 26 de setembro de 2012.Rogério Gribel é pesquisador em Genética e Ecologia Vegetal e Diretor de Pesquisas Científicas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
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